Especialista fala sobre sintomas, riscos e tratamento para a pneumonia química
Danielle Monteiro e Renata Moehlecke
Na
madrugada de domingo (27/1), uma tragédia chocou o país: um incêndio em
uma boate da cidade de Santa Maria, na região central do Rio Grande do
Sul, provocou a morte de ao menos 231 jovens. Aos sobreviventes ainda
resta o perigo de contrair a pneumonia química, uma doença perigosa que,
se não tratada, pode levar à morte. Com o intuito esclarecer sobre a
enfermidade, o pneumologista e pesquisador da Escola Nacional de Saúde
Pública (Ensp/Fiocruz), Hermano Albuquerque de Castro, concedeu
entrevista à Agência Fiocruz de Notícias (AFN), na qual
fala sobre os sintomas, riscos e tratamento para a
doença. Castro também é o atual presidente da Comissão de Doenças
Respiratórias Ambientais e Ocupacionais da Sociedade Brasileira de
Pneumologia e Tisiologia (SBPT).
Quais são os principais sintomas da doença? Até quantos dias pode se manifestar a enfermidade?
Hermano Castro: Principalmente tosse e falta de ar. Algumas
pessoas podem manifestar chiado no peito. De um modo geral pode se
manifestar até três dias após o acidente.
Qual o perigo da pneumonia química?
Castro: A fumaça inalada encontra-se em altas
temperaturas durante o incêndio e, neste caso, ocorre sempre o dano
físico ou uma agressão térmica na estrutura pulmonar. Junta-se a isso a
presença dos gases tóxicos com potente poder inflamatório. Pessoas
sobreviventes de incêndios costumam inalar fumaça (produtos incompletos
da combustão) produzindo um dano inflamatório nas vias aéreas e isso
pode ser responsável por até 70% da mortalidade em pacientes vítimas dos
incêndios.
A fumaça é a mistura de gases, como o monóxido de carbono (CO), dióxido
de nitrogênio (NO2), dióxido de enxofre (SO2) e material particulado. Os
gases e os particulados podem agir diretamente sobre as células que
constituem o revestimento pulmonar produzindo o processo inflamatório. O
mecanismo da ação pode ser por lesão térmica direta decorrente da
temperatura da fumaça; redução da inalação do oxigênio com diminuição da
fração inspirada de oxigênio, o que pode levar ao óbito; gases tóxicos
que agem localmente produzindo inflamação aguda; e gases tóxicos de ação
sistêmica, como o monóxido de carbono (CO) e o cianeto (o CO liga-se a
hemoglobina reduzindo o transporte de oxigênio para o organismo).
Que medidas devem ser tomadas pelo indivíduo após passar por uma situação que possa desencadear a doença?
Castro: Pessoas que ficam expostas em situações onde ocorre
inalação de grande quantidade de fumaça (gases tóxicos) e com elevada
temperatura devem ser orientadas quanto à possibilidade de sintomas e,
dependendo do caso, permanecer em observação e acompanhamento clínico.
Idosos, crianças e pessoas que sabidamente são portadores de doenças
pulmonares, como asma ou doença pulmonar obstrutiva crônica, devem
sempre ficar sob observação clínica.
Por que situações de incêndio podem desencadear a doença?
Castro: A fumaça inalada é a causadora da doença e a
intensidade da lesão pulmonar depende do tempo de exposição aos gases e
da toxicidade do gás inalado.
Além de incêndio, que outras situações são propícias para o desenvolvimento da doença?
Castro: Ambientes com a presença de gases tóxicos, solventes,
vapores podem desencadear uma pneumonia química. Ambientes de trabalho
com a presença de produtos químicos aumentam o risco para a doença.
Qual o tratamento utilizado para a doença?
Castro: Em primeiro lugar a manutenção da via aérea e suporte
ventilatório com aporte de O2. Para redução da inflamação e edema pode
ser indicado o uso de corticosteroides. O uso de antibióticos está
indicado quando há indícios de infecção secundária, em geral após o
terceiro dia do acidente. A clínica respiratória poderá definir o uso ou
não de broncodilatadores.
Algum tipo de medida deve ser evitada nesse caso?
Castro: O mais importante é o acidentado procurar imediatamente
um serviço de saúde após o acidente, mesmo que não tenha ainda a
presença de sintomas imediatos, como tosse ou falta de ar. Os sintomas
podem aparecer tardiamente em 24 ou até 72 horas.
Situações de incêndio podem desencadear o aparecimento de outras enfermidades além da pneumonia química?
Castro: Além das lesões pulmonares e corpóreas decorrentes da
queimadura, existe sempre a possibilidade do stress pós-traumático,
desencadeamento de quadros hipertensivos ou descontroles de doenças
endócrinas em pessoas portadoras de patologias prévias ou latentes.
Retirado de: http://www.fiocruz.br/ccs/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=5107&sid=3